Sob o título “A Laboratory for Revitalizing Catholicism” [Um
laboratório para revitalizar o catolicismo], a longa matéria do jornal
The New York Times abordou o desafio que o sucessor de Bento XVI terá
para fazer com que o Brasil continue sendo o país com a maior população
católica do mundo.
O jornalista Simon Romero, que assina a reportagem, enfatizou como a
Igreja católica tem se “reinventado” nos últimos anos, atraindo milhares
de pessoas para as missas onde as músicas de louvor com coreografia do
padre Marcelo Rossi e o visual “galã” aliada a fundamentos de autoajuda
dos sermões do padre Fábio de Melo.
“Se há um país que reúne os desafios enfrentados pelo catolicismo no
mundo, é o Brasil, nação com o maior número de católicos, que serve como
uma espécie de laboratório para as estratégias da igreja para atrair de
volta os seguidores perdidos”, diz o texto.
Ao mesmo tempo, o Brasil disputa com os Estados Unidos qual nação tem
o maior número de pentecostais do mundo. Conforme atesta o censo de
2010, atualmente, 65% dos brasileiros ainda se consideram católicos.
Eram mais de 90% em 1970. “O declínio tem sido tão excessivo e contínuo,
que o cardeal Cláudio Hummes, um dos maiores líderes da Igreja Católica
no país questiona ‘Por quanto tempo o Brasil continuará a ser um país
católico?’”, diz o jornal
Segundo Silvia Fernandes, socióloga da Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro, ainda existe a questão das grandes divisões na Igreja
Católica brasileira. De um lado, as lideranças mais conservadoras e
tradicionais da Igreja, que vivem na região sudeste, onde as missas são
mais influenciadas pelos padres cantores e o movimento da Renovação
Carismática, “que busca revigorar as cerimônias católicas para
aproximá-las do que os paroquianos muitas vezes iam buscar em outras
igrejas [evangélicas]”.
Do outro, os bispos do Nordeste e da Amazônia, mais focados nos
problemas sociais, direitos humanos, desflorestamento e luta indígena.
Ainda segundo o jornal, os católicos se ressentem de não serem mais
protagonistas em relação a muitas questões sociais e assistem os
evangélicos se destacarem na política e usarem cada vez mais os meios de
comunicação para continuar crescendo. Uma das dificuldades do movimento
de renovação católica no país, é a tendência de católicos brasileiros
absorverem elementos de outros movimentos religiosos, como fizeram com
as práticas afro-brasileiras no passado.
Isso enfraquece a identidade católica e abre a porta para uma prática
espiritual “altamente híbrida”, assevera Stephen Selka, especialista em
religiões africanas da Universidade de Indiana.
Embora o número de evangélicos continue crescendo a cada ano, o maior
desafio apontado pelo jornal é “o crescimento da secularização e
indiferença em relação à religião”. Para Andrew Chesnut, especialista em
religiões latino-americanas da Universidade Virginia Commonwealth, não
se pode ignorar que o segmento que cresce mais rapidamente no cenário
religioso brasileiro são os “ateus e pessoas sem religião”, totalizando
15% da população.
Chesnut enfatiza que “Em um país que tinha níveis desprezíveis de
ateus até a década de 1980, esse desenvolvimento aponta para grandes
mudanças na sociedade brasileira. Para aumentar o problema para o
Vaticano, o número de católicos nominais que abandonaram as missas só
aumenta, enquanto os católicos praticantes muitas vezes expressam
frustrações em relação às políticas do Vaticano”.
Philip Jenkins, professor de história do Instituto de Estudos da
Religião na Universidade Baylor, considera que a tendência da América
Latina é ver o número dos ateus e sem religião crescer, como ocorre na
Europa e nos Estados Unidos.
Um dos maiores indícios da perda de força do católicos continuará
acompanhando a queda nas taxas de fertilidade, que no Brasil é uma das
menores da América Latina, com cerca de 1,83 criança por mulher.. “Para a
igreja significa menos crianças sendo batizadas, menos jovens
candidatos a serem padres e freiras, e a diminuição dos laços com a
Igreja Católica que tinham seus pais. Se eu fosse um cardeal brasileiro,
estaria mais preocupado com o tamanho da família e as taxas de
fertilidade, um prognóstico muito bom de secularização, do que com o
Pentecostalismo”, resume Jenkins.
É possível reverter esse prognóstico de fim iminente? Na análise do
New York Times, muito pode mudar com a eleição do novo papa. Dois
brasileiros, o cardeal João Braz de Aviz e Odilo Scherer, arcebispo de
São Paulo, são os apontados como fortes candidatos a suceder Bento XVI.
Além disso, a Jornada Mundial da Juventude será no Rio de Janeiro
este ano. Muito provavelmente será a primeira viagem do novo pontífice
ao país, já que a presença havia sido prometida pelo Vaticano. “Muitos
fiéis brasileiros têm esperança que essa viagem indique um novo foco do
Vaticano, diante da dupla ameaça da competição evangélica e crescimento
do secularismo”.